terça-feira, 19 de outubro de 2010

Sobre a organização do caos


E é quando me sinto entardecer que vem a vontade inerte de escrever. Por dentro latejam rimas soltas, sem direção. Procuro no meio da confusão de sentimentos um papel-teclado para fazer brotar flores onde há caos. E vem reza de anjo torto, vem súplica de diabo querendo virar anjo. O que vier eu desentorto, alinho, tento. E tem tentação de dedicatória também. Nunca para mim.O vitrilho-mente divide-se ao meio, metade arco-íris e em metade, cor não há. Repouso sobre lembranças ainda vívidas, relíquias de esperança e fico a contemplar. Se um botão abre-se em flor, é meu coração que acelera. E agora mesmo, na primavera, meus versos pobres saem salpicados da canção das cigarras. É preciso esses instantes onde pairo sobre mim mesma. Tomo em mim um grito rouco, desenho louco se faz. E que Deus abençoe meus dias em que transformo angústia em mel ou dias em cartas, poesias e amor.

sábado, 2 de outubro de 2010

Considerações sobre quem ama


E porque sempre foi assim não quer isso dizer que sempre será. O que digo hoje pode não ser o mesmo amanhã. A brisa que hoje passeia leve pelos meus cabelos pode voltar no futuro como fúria de vendaval. Carregando consigo pó de minério que um dia brilhou. Não quero prender-me a erros idos em dias tidos como bons. A vida expressa e contida em versos me espalha e desnuda a alma presa ao corpo que acorrenta. E é quando morro que acordo para desejos e anseios. Incontinência arbitrária que atira-me ao longo da tarde. Nessa chama de fogo-fátuo é que me espreguiço e sigo. Nuances de cetim e carmim que brotam de meus lábios.  E não adormeço enquanto cada palavra que ouso dizer não couber em minha boca. Ainda bebo cada gota contida nesse cálice. Manhãs inversas, tardes cálidas, noites frias. E longas, insones. Deve ser porque durmo chorando que amanheço poesia. Quem ama entende bem o que digo...

Considerações sobre a paciente insistente


Ela pensa que a dor é coisa fincada no coração da gente e que puxa a gente pro centro da terra tentando nos firmar no buraco que vem do vazio da mente da gente, que mente. O que ela não sabe é que se não é pelo amor é mesmo pela dor que a gente cresce, ou melhor, transmuta. E nesses dias de chuvas primaveris é dentro dela que chove, como uma tortura fininha, lambendo-lhe a pele e a alma. Ela olha pela janela, na vidraça, as gotas que caem são dela e pelo rosto escoam em tórridas sensações de plenitude e vazio. Conta os quatro ventos que ama, que chora e que goza. Conta que está viva ainda e quer e pode. A menina-mulher pensa que é tristeza, mas dela emana-se luz de sol. Porque lá dentro dela a semente brotou e embora tímida quer luz, e briga pra sair por aquela fresta que ainda resta. E vai ser exatamente naquele dia D,  dentro do seu vestido azul que ela vai sentir e vibrar, pois com ela hão de se fiar no firmamento todas as estrelas...