terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Vale um rio doce?


Da varanda, lugar de ver a natureza, descortina-se a destruição. O homem com sua ganância não mede esforços para te destruir, Yasmin.
Eles sabem o que fazem Mãe, o problema é o medo, o descaso...
É fácil deitar a consciência no travesseiro, basta fazer orações e fingir que esquece; basta fechar os olhos para fora e para dentro. É facil lavar as mãos afinal "não fui eu quem fiz mesmo".
Não. Nem eu nem ninguém temos culpa de agredir sem pedir licença
Nem eu nem ninguém temos culpa de dilacerá-la, Mãe, ou deixar que o façam ( afinal o que adiantaria fazer algo contra?).
E enquanto isso caem as montanhas nos vagões da indiferença, nos vagões da indecência. E, despindo-te mãe natureza deixamos suas feridas abertas ou vestidas como A roupa do Imperador, mas quando é mesmo que gritarão; " O rei está nu!!"?
Não é nada não...Mãe, para nos promover vamos vesti-la com a roupagm de longos e incontáveis eucaliptos.
Agora sim, já dá para convencer as paredes e dormir tranquilo.
Mas saiba, Mãe, que no fundo, bem no fundo do peito sabemos que não é nada disso ! Psiu, fala baixo.
Yasmin, aqui estou!
Peço perdão por todo o mal que te fazemos. Perdão!
Como diz o poeta: "Apenas um retrato na parede, e como dói".
Agora, vivenciando, sei que faria o mesmo que ele; agora eu compreendo exatamente o sentimento e a escolha do poeta. E como dói.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

A volta


O anjo bom voltara com novas vestes.
Dessa vez M. sentia que prosseguiria, com passos tímidos mas firmes. Sabia que nada a separaria de seu anjo verdadeiro. Sabia que nem a distância e a separação física os impediria de seguirem lado a lado.
E o tal anjo disse: " M. , você é capaz! " e então partiu com suas enormes asas prateadas para além do céu. O anjo ia planando com sua veste mais pura.
M. já não se incomodava com esse fato, estava protegida.
(...) " Tudo se preenchia com a presença da ausência"
Outrora morria de medo de experimentar suas asas mas agora ousava seu primeiro vôo.
Fechava os olhos pensando na chegada do anjo e em senti-lo consigo.
O anjo ria do seu esforço, precisava de mais fé...
O que M. não sabia é que ela estava entupida de fé confortavelmente adormecida dentro de si... Tinha tanta que se não compartilhasse M. poderia até adoecer.
M. agora conseguia dar vazão a tudo o que ela sentia; seu anjo não a julgava por isso. De dia pensava nele e o cair da tarde era ainda mais belo; a noite sua alma vagava para se encontrar com a dele...

domingo, 10 de fevereiro de 2008

Paz


Onde buscá-la? Dentro de mim.
Sobrevoei por lugares inatingíveis em busca de ti. Voei mundos, caminhei a passos tímidos, ora a passos largos.
Muitas vezes, desesperada, pulei do precipício em um mergulho na procura infindável na escuridão do mar...mar revolto. Outras vezes deixei a água da cachoeira banhar todo o meu corpo...cachoeira límpida. Águas turvas, águas transparentes.
Anos e mais anos de tentativas vãs de encontrar no mundo exterior o que se encontra guardada em uma caixinha do mais puro cristal dentro do meu coração.
Ainda pensei que fosse fácil, depois da descoberta penetrar de corpo e alma e então ser feliz. Novo engano...
A paz está guardada e adormecida mas preparando-se para enfim despertar!
E então não é um exercício diário, um eterno autorealizar-se, uma reforma íntima, um estado de espírito lapidado com cuidado e sempre...
Paz, irei fundir-me a ti.

Mel


Tivesse eu o poder de transformar fel em mel; despejaria nos rios, mares, cabos, oceanos, adocicando a vida dos humanos tão calejados, pobres espiritualmente, sedentos de paz.Tenho um secreto desejo: fazer nascer em mim asas enormes, brancas, plumosas, dessas que se vêem anjos adultos. Sobrevoaria todo o planeta e quem sabe outros habitados e inabitados...( já que é pra sonhar alto poderia até visitar o Pequeno Príncipe no seu planetinha). Pobres de nós que conhecemos só uma migalha do Universo enquanto nesse plano.Deve haver milhões de outros lugares com seus céus, luas, cachoeiras e montanhas...O que me acalanta é saber que tudo aqui é efêmero e passageiro, estamos de passagem e a certeza de que pelo menos bagagem espiritual levaremos quando nos formos...A alma, presa ao corpo...isso é que nos faz sofrer pois já estivemos em tantos lugares maravilhosos, com pessoas verdadeiramente maravilhosas. Hoje nos resta essa prisão, que é o nosso corpo denso que um dia retornará de onde veio, da natureza, e assim o ciclo recomeçará...Gostaria de explodir para que cada “ pingo de mim” – ( do meu lado bom) pudesse ajudar a quem necessita pois meu amor é universal e incondicional, não pode parar em mim.Sou cercada de pessoas das quais amam e que com certeza me querem bem mas ainda assim muitas vezes caio numa solidão profunda.Ah...mas o dia há de chegar em que outros estejam prontos a explodir também...formaremos no cosmo milhares de centelhas de luzes coloridas iluminando a verdadeira vida ( a da alma), exaltando o criador.E aí, tudo será novamente uma coisa só, como foi um dia, na origem de tudo.Posso sentir-me cansada, às vezes, mas desistir, jamais!
Maio, 2007

Vibrações


Comecei escrevendo poesias melancólicas na adolescência, tinham algumas que eu até gostava, era muito influenciada por Fernando Pessoa e todos os Pessoa da sua doce dissociação ( pra quem não sabe o que é, ver Freud – rs), por um bom tempo a fonte secou ( ou eu estava seca?) agora me atrevo a esboçar uns textos que minha irmã, Mestre em literatura, chama de textos híbridos...Por vezes me vem a inspiração, geralmente nas noites de insônia que não quero preencher com remédios para dormir mas com algo produtivo...( minha psicóloga diz que preciso investir minha libido de uma forma produtiva)...rsHoje peguei meu filhote na escola e vim pensando que do jeito que as coisas andam tenho duas alternativas: ou escrevo, ou escrevo...porque o que escrevo pode não valer nada mas é dessa forma que tenho exorcizado meus fantasmas.Mas o que me deixa mais feliz é que ( incrível) as pessoas estão gostando, vocês acreditam que meu ilustre primo ( escritor e jornalista ) Petrônio gostou do que escrevo?O pôr do sol aqui em Itabira não é bonito como o de BH, principalmente o da janela do Hudson, mas dá pro gasto...as tardes já estão começando a prometer aquele friozinho básico que faz aqui. As noites têm sido estreladas e semana atrasada tinha uma lua redonda que me inspirou no que eu poderia chamar de meu primeiro texto híbrido....( adorei mesmo, Lé...), escrevi direto no perfil do meu orkut mas queria postá-lo aqui...
Ela então olhou a lua da varanda de seu quarto e de repente toda a sua vida enchia-se de sentido novamente...Lua cheia, renovação de energias...Vibrações boas chegam enfim...Ela olhou a lua tímida tendo o céu como leito brilhando diamantemente...E decidiu timidamente a voltar a brilhar...
Abril, 2007

A gata borralheira


O dia amanhecia e Pedro não havia dormido ainda...a noite em claro lhe imprimira uma olheira incomensurável...olhou-se no espelho e não ousou nem sequer fazer a barba...Vismundo lhe dera uma lambida na perna esboçando um bom dia mas ele não notara.Toca o telefone justamente na hora em que ia sair, coisas da Lei de Murphy...“Alô?”Silêncio.“Alô!”Silêncio...“Ligou só pra ouvir minha voz? Otário!...”Desligou.Pedro não suportava isso, coisa de adolescente, coisa que não eram mais. Pedro sabia que quem ligara era Marília, a sua Marília que o abandonara a exatamente três anos, dez meses e sete dias...sabia também que o remorso lhe coroava os dias. Mesmo assim não tinha coragem de lhe dizer o que sentia...Bateu a porta com força e entrou no carro. O trânsito o enlouquecia ainda mais, preferia realmente o trânsito de saturno...Chegando ao trabalho Pedro desanimava cada vez mais.Não conseguiu trabalhar naquele dia... cheio de projetos com data para entrega, tinha que dar a volta por cima e conseguir.Mas Pedro ainda confuso pela falta de descanso rodopiava os pensamentos em Marília, essa mulher que lhe roubara a vida e a alegria de viver.Marília chegara como quem chega do céu... devagarzinho e flutuante. Passaram vinte anos de suas vidas juntos, ora isso não era vinte dias. Acostumara com seu jeito, seu cheiro, sua forma de dormir abraçada a ele sufocando-o como se ele fosse fugir...Marília era dessas mulheres que estavam sempre perguntando se estava tudo bem... cuidava da casa e de seu homem...não podia ter filhos mas isso era um detalhe...tanta criança precisando de pais...Muitas vezes, quando Pedro voltava do bar pra onde sempre ia depois do trabalho com colegas que saiam à caça, ela o esperava com seu jantar e um sorriso no rosto... perguntava se ele estava com algum problema e por isso andava bebendo tanto...muitas vezes fingiu não sentir o perfume barato que impregnavam suas roupas...Não entendia como aquela cabeça funcionava mas seus amigos já diziam que mulher gosta mesmo é de apanhar...então, normal...Assim os anos seguiam mas Marília já ficava cansada daquilo.Um dia, sem drama, sem tempestade ela simplesmente passara na sua frente com a roupa do corpo e saíra.. .telefonou meses depois dizendo que estava bem e tentando ser feliz...mas como? Ela não era feliz? Ele pagava as contas, dava duro na agência pra bancar tudo que precisassem... sem seu salário gordo Marília não sobreviveria pois ganhava muito menos que ele...e assim a mantinha em cárcere privado para que fizesse sua parte e a dele também.Mas Marília era uma mulher jovem, bonita e amável... e isso encantava quem não a possuía...e a fazia pensar pois do contrário do que Pedro pensava ela não estava feliz com aquela situação.Simplesmente mentia para os amigos quando perguntavam por ela... ”Está viajando, passando uns dias com a mãe, que não desgruda dela”...Manter a pose era essencial, Pedro era um homem forte e bem resolvido.Só não contava que um dia a gata borralheira se transformaria em Cinderela, e isso o deixara fora do prumo...Os anos sem Marília lhe fizeram enxergar o valor que ela tinha... mas era tarde demais...só não entendia porque ela ligava e ficava calada...sabia que era ela pois com o tempo aprendeu a reconhecer sua respiração ofegante.Entretanto Pedro já estava confuso...andava sendo assediado por vagabundas que só queriam seu dinheiro.Envolto em seus pensamentos Pedro não produzia a tempo, seu chefe já lhe dera o intimato...Mas Marília estava muito além dessas pequenices mundanas... com seu jeito cativante logo aprendeu a se virar sem Pedro. Por isso mesmo sua preocupação com o bem estar daquele que lhe fizera muito mal ainda persistia. Já o perdoara mas ainda havia algo a ser reparado.Algum tempo depois Pedro apareceu novamente com Marília perante a sociedade...mas aquele homem gentil e apaixonado era mesmo Pedro?

Abril, 2007

Revelações


Ela entrou no ônibus em um estado ímpar, era como se naquele exato momento a vida fizesse mais uma revelação. Sempre que passava por esses raros momentos, sua alma enchia-se de luz radiante e a sensação era de ter todo o corpo envolto nessa luz e todos os pelos corpo ( o do couro cabeludo era o que mais lhe impressionava) arrepiavam-se.
Sentou-se em uma cadeira qualquer decidida a fazer a escolha certa, a de ser feliz.
Então viajou viajando...seu pensamento voava longe e lembranças de um momento único e mágico vividas com um ser que certamente descera do céu em forma de homem – aliás meio anjo meio demônio – para lhe tentar e lhe salvar.
Tudo que acontecera e tudo que havia sido dito imprimira marcas definitivas...sentia que tudo já estava em sua mente mas precisava que fosse dito por outra boca...macia...
Ela estava naquela fase da vida em que crises existenciais brincam ciclicamente... E como era estranho pensar que sempre, sempre em sua vida toda, mutações evolutivas aconteciam no início do ano; já chegou a achar normal afinal de contas, ano novo é sinônimo de vida nova. Mas será que era só por isso? - nada disso... era uma sincronicidade, no fundo ela sabia. Mesmo porque tinha que ser naquele momento, naquele tempo e não em outro antigo.
A rodovia iluminada contrastava com o reflexo da lua nas águas da represa...ela olhava e sentia-se ainda mais iluminada.
A pouco mais de duas semanas começara o processo...as noites insones, o pensamento que não cessava...a busca como instinto de sobrevivência...
Parou e pensou que todos os seus esforços não traziam resultado... - vai ver é melhor mesmo dar um tempo na busca – e lembrou-se de um verso de Quintana que dizia mais ou menos que o segredo é não correr atrás das borboletas mas cuidar do jardim para que elas venham até ele.
Nunca dormiu tanto em sua vida, esse estado latente em que se encontrava fazia parte do processo.
Precisava cair nos braços de Morpheus para que pudesse fechar sua gestalt.
No dia seguinte pulou de ponta no rio, mergulhou até o fundo para que batesse as mãos no fundo e tivesse forças para subir à superfície. Nadou até o outro lado e deitou na pedra descansando novamente.
No último dia estava pronta enfim para queimar o que não valia mais e renascer das cinzas.
E mais: sabia que brevemente alçaria vôo novamente.
E assim voava entre promessas de um amanhã melhor, mais vívido...
Abril, 2007